Mas,
afinal de contas, como funcionam as vacinas para nos proteger das doenças
infectocontagiosas?
O
sistema imune é o componente do corpo responsável por detectar a presença de
organismos ou substâncias que possam ser de alguma forma nocivos para a saúde do indivíduo. Ao
reconhecer o risco associado ao contato do corpo com um agressor (vírus,
bactérias, fungos, protozoários e parasitas), os componentes do sistema imune
devem responder produzindo substâncias ou mobilizando células que têm por objetivo destruir o agressor. De uma
forma simplificada, existem dois componentes mais importantes do sistema imune
que estão envolvidos nessa resposta: anticorpos e linfócitos. Uma
característica importante dos anticorpos e linfócitos é que eles
são extremamente especializados. Por exemplo, quando o organismo fabrica um
anticorpo, ou ativa um linfócito contra o vírus da caxumba, estes servirão
apenas para combater o vírus da caxumba e nenhum outro agressor. É importante
salientar que quando uma pessoa tem quantidades adequadas de linfócitos e
anticorpos contra um determinado agressor, num eventual encontro, o agressor
será rapidamente destruído e a pessoa não manifestará a doença.
Entretanto,
as pessoas não nascem com anticorpos e linfócitos prontos para combater os mais
diversos tipos de agressores presentes na natureza. Ou seja, o nosso repertório do
sistema imune não vem pronto quando nascemos. Para proteger uma criança no
início da vida, a mãe transfere uma certa quantidade de anticorpos pela
placenta, e mais um pouco pelo leite, durante a amamentação (destaco aqui mais
este importante benefício da amamentação). Tais anticorpos são capazes de proteger a
criança até aproximadamente o sexto mês de vida. Daí em diante,
a criança terá que combater as doenças por sua própria conta.
Para
construir o seu repertório imunológico a criança precisa entrar em contato com o
potencial agressor. É exatamente aí que mora o perigo. Após entrar em contato com o agressor, será necessário
algum tempo para que anticorpos sejam fabricados e linfócitos ativados em
quantidades suficientes para oferecer segurança na luta contra o agressor. Na
maior parte das vezes, os agressores não são muito vorazes e a criança
conseguirá controlar a infecção adequadamente depois de alguns dias. Porém, existem
agressores que são bastante rápidos e eficientes de tal forma que, enquanto o
organismo da criança está tentando produzir anticorpos e ativar linfócitos, o agressor já
proliferou muito e causou danos que muitas vezes são irreversíveis, podendo
inclusive levar à morte da criança.
Assim, conseguir combater danos causados por agentes infecciosos é uma
questão de equilíbrio entre o tempo de resposta do organismo e a agressividade
do agente infeccioso. Devendo o tempo de reposta ser mais rápido do que o potencial
agressivo do agente infeccioso. Existem agressores que invariavelmente tem um
potencial agressivo e uma velocidade de proliferação maiores do que a
capacidade de resposta da maior parte dos seres humanos. Ou seja, se uma pessoa
entrar em contato com estes agressores sem ter uma defesa previamente montada,
haverá uma chance bastante grande desta pessoa ficar gravemente debilitada ou
mesmo morrer. Por sorte, ao longo dos anos, os pesquisadores vem conseguindo
identificar a maior parte dos agentes infecciosos que tem grande potencial de
agressividade. Podemos citar aqui os vírus da varíola, sarampo, hepatite B,
caxumba e raiva; ou bactérias como aquelas causadoras de meningite, coqueluche,
pneumonia e peste. Os pesquisadores aprenderam também a cultivar estes agentes
infecciosos e torna-los menos agressivos (inativando-os de alguma forma).
Ao injetar em uma pessoa uma pequena quantidade destes agentes na sua
forma inativada, obtém-se uma resposta do sistema imune que é suficiente para
protege-la por muitos anos de um eventual encontro com o agente presente na
natureza. Os pesquisadores aprenderam também que para alguns agentes
infecciosos é necessária a injeção da forma atenuada do agente mais de uma vez,
daí as doses de reforço de algumas vacinas. Ao vacinarmos uma pessoa ela produz
anticorpos e ativa linfócitos específicos contra aquele agente agressor
utilizado para fabricar a vacina. O mais importante é que o sistema imune tem
memória. Isto permite que muitos anos após a vacinação a pessoa ainda preserve a capacidade de combater o agente agressor. Assim, de forma resumida, a
vacinação é um procedimento preventivo no qual um agente infeccioso numa forma
atenuada é injetado em uma pessoa com o objetivo de estimular a produção de
anticorpos e ativar linfócitos de memória que protegem o individuo por
muito anos de um eventual encontro com o agente infeccioso em questão.
Pronto, agora só precisamos saber o que está acontecendo em regiões onde
houve redução do número de crianças vacinadas. Este será o tema do Capítulo
final desta série.